domingo, 16 de dezembro de 2012

XX





Há momentos da nossa vida em que ficamos suspensos. Teletransportados para outro mundo, outra dimensão, quiçá outro universo, flutuamos nas ondas do vácuo, ao som de uma música que vem de todo o lado e não nos questionamos o que é, porque na verdade não sabemos o que somos e muito menos onde estamos. 
Feitos de matéria cósmica, nascidos de areia de galáxias com milhões, triliões de átomos, coisas realmente pequenas que agora são pontinhos acesos que brilham à nossa frente e que não lhes conseguimos tocar, viajamos. A nossa alma responde ao ondular do vazio e torna-se ela própria o ser, a areia e a matéria, fundindo aquilo que somos e vivemos com nada e assim ficamos neste estado de inconsciência. Pairamos no desconhecido, deslizamos, nus de carne, nus de osso, lentamente, num calmo passeio ao paraíso momentâneo, pai de tudo e filho de nada, que se nos aparece azul, violeta, vermelho, nem sei bem, mas é tão belo que a sua cor se desdobra em bondade e a bondade em felicidade. Ali vivemos eternamente, longe do nosso casaco de pele, de veias e artérias para sentir o que não se sente com olhos que não vêm. Não temos membros, somos pó! Somos a nossa alma e só dela sabemos quem somos porque dela saímos.
O mundo, a terra, as pessoas? Saberão eles onde estamos? Saberão eles que isto é o paraíso e somos pó e areia e alma despida de sofrimento e dor?
Deus, se tal coisa realmente existe, será isto. Será também nós, unidos dentro deste vazio cósmico.



Começa a aparecer uma certa luz, mostrando o seu tom alvo, reluzente, limpo. Como que se nos sugasse, viajamos à velocidade da luz e a Terra vai-se-nos aparecendo à frente, em forma de berlinde, azul, tornando-se cada vez maior, cada vez mais familiar e o vácuo começa a desvanecer-se e vamos sentindo agora os dedos, os braços, as pernas, os olhos, o nariz e a boca. O sabor, a água, o vento, o frio e calor são agora coisas e nós sentimo-las. Agora pensamos. Agora sabemos realmente quem somos e de onde viemos. Estamos presos noutro mundo, num mundo com infinitos acontecimentos e seres. A areia, o pó e a alma materializam-se e os nossos olhos ficam abertos, quietos, atentos ao que se passa.
Conseguimos regressar. Será que lá voltaremos?
Começa agora a debandada amnésica em busca do desconhecimento e vamos, à medida que o mundo  surge ao nosso olhar, esquecendo.
Deixamos de acreditar em tais mundos pois agora tais mundos não existem.



Há mais coisas no mundo do que aquelas que nos saltam à vista. 



Thibaut Ferreira
Lisboa, 16 de Dezembro de 2012

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

XII







Passava o minuto 31 das sete da tarde.
Descansado, recostado na cadeira de madeira, esperava assim que chovesse. Realmente, já não chovia há bastante tempo: três quinze dias, mais coisa menos coisa.
Corria-se pelo país inteiro, que faltava água: o gado, de tanto castanho seco, esquecera-se do verde.
Por estes lados, passava-se a mesma coisa. Eram as batatas que não se podiam pôr, era o trigo que não crescia, era o pessoal que não tirava as t-shirts e os bombeiros, entretanto, enchiam de água os reservatórios das populações.
Pesquisou naqueles sites de meteorologia que dizem o tempo à semana e constatou, efetivamente, que ia chuviscar no sábado.
Os sóis em ponto pequeno que preenchiam a tabela da meteorologia do tal site, indicavam que até sexta ia fazer sol todos os lindos dias. Era quarta. Até que não faltava muito – pensou. Desligou a Internet e fitou a imagem de fundo do computador durante alguns segundos, uma espécie de “estagnamento” cerebral. Olhou para a janela e levantou-se. Foi à casa de banho e enxaguou a cara com água fresquinha e deitou-se de seguida.
Por razões incógnitas às pessoas que não estudam essas coisas, o cérebro não o deixou dormir por uns tempos. Ficou a pensar. A pensar em coisas. Montes delas: a chuva, o sol, a água, a cama, o cérebro, sei lá…
Adormeceu.
No dia a seguir esqueceu-se do tempo e da água.
Foi trabalhar e cansou-se. Chegou, comeu pão com queijo e foi para o quarto.
Era algo tarde quando adormeceu. Começou a chover.

Thibaut Ferreira

domingo, 2 de dezembro de 2012

XV





E ali estava, sentado.
A cadeira era confortável, apesar de estar com as “perninhas à chinês”.
Chovia como nunca tinha visto antes em Lisboa, não que eu já tenha visto chover em Lisboa, mas chovia bem.
Lá longe na minha terra chove muito e isso é sinónimo de frio, de camisolas, camisolões, casacos quentinhos, lareira, torradas e histórias.
É diferente aqui na capital, a água que chegou ainda demorou um tempito, se bem que as estradas agora estão bem melhores.
Recém chegada, caía por favor, com o cansaço acumulado dos lados da minha terra. Tem muitos altos e baixos a minha terra.
Estava a olhar pela janela, que meio embaciada pela humidade, via-lhe correr gotinhas, fazendo crescer aquele desejo infantil de desenhar o nosso nome com o indicador mesmo sabendo que se vai apagar dali a uns segundos.
As ruas estavam a ser bombardeadas por água. Como resposta escorriam-na pela avenida abaixo, tipo chuto, que ao fim de algumas horas deveria chegar à Baixa, ao Tejo e depois ao Atlântico, misturando a terra, o suor, as marcas dos sapatos com o sal.
Ria-me. Era engraçado ver aquela água toda a cair, com todos aqueles carros a passar em azáfama, quiçá para ir buscar os filhos à escola, quiçá porque há azáfama todos os dias.
As pessoas molhavam-se completamente: ninguém esperava e portanto julgo que a chuva se risse também, isto antes de se esmorrar contra a calçada ou contra o alcatrão.
Fitei aquele espetáculo onde a ação recaía ou nos relâmpagos, que de vez em quando apareciam tipo bobo da corte a dar a moral da história, ou na chuva, que não se cansava de cair.
Quinze minutos ali estive.
Começava a ter formigueiro na perna direita e sentei-me direito.
Fiquei com a sensação de que este mundo é imprevisível, bem frio quando é Inverno e que o formigueiro incomoda. Prefiro o Verão.
Não gosto lá muito de chuva, acho-a aborrecida, faz-me lembrar os “mais velhos” sempre a dizer a mesma coisa,...
No entanto, faz crescer milhões de plantinhas, plantas maiores, arvoredos, árvores, florestas, que por sua vez sustentam e ostentam milhões de seres vivos, conseguindo manter a estabilidade de oxigénio nesta Terra em que são cada vez mais a respirá-lo e menos a respeitá-lo.
Aparece quando é necessário, se bem que ultimamente tem demorado mais que o previsto, mas aí, sabemos de quem é a culpa, porque Deus tem sido bondoso e tem mandado as gotinhas sempre que pode.
Tudo a água nos pode dizer. Tudo a água nos pode mostrar.
Deixem-na vir, ainda que seja chatinha, assim sempre crescem as batatas e os feijões e montes de outras coisas mais. Ainda que por muito egoístas, arrogantes, simpáticos, pessimistas, humildes ou racistas que sejamos, a chuva vai continuar a cair e se não tomarmos as devidas precauções, molhamo-nos, o que é desagradável, ou pelo menos molha.
O melhor é serem simpáticos e otimistas porque quando a chuva vos cair em cima, vocês irão rir-se e rir faz bem à saúde.



Thibaut Ferreira,
Lisboa, 25/09/2012

Dire Straits - Sultains of Swing

Have a good night ;D

Gene therapy for blood disorder a 'success'

Gene therapy has been used for the first time to treat an inherited blood disorder in what doctors say is a major step forward.
A man given pioneering treatment to correct a faulty gene has made "remarkable" progress, a US and French team has revealed.
Gene therapy is an experimental technique that manipulates genes in order to treat disease.
Red blood cells
The patient suffers from an inherited disorder which
affects his body's ability to create red blood cells
It has seen some successes, but also setbacks, including a patient's death.
Beta thalassaemia is an inherited blood disorder that affects the body's ability to create red blood cells.
The first gene therapy trial was in an 18-year-old man with a severe form of the condition, who had been receiving regular blood transfusions since the age of three.
Stem cells from his bone marrow were treated with a gene to correct for the faulty one.
They were then transfused back into his body, where they gradually gave rise to healthy red blood cells.
Three years after the treatment, which took place in 2007, the man remains mildly anaemic, but no longer needs blood transfusions, doctors said.
The team, led by Philippe Leboulch, of Harvard Medical School in Boston, said: "At present, approximately three years post-transplantation, the biological and clinical evolution is remarkable and the patient's quality of life is good."
But, reporting in the science journal Nature, the doctors sounded a note of caution, saying there was a possibility that the patient could be at risk of developing leukaemia in the future due to side effects from the gene therapy.
Gene therapy has been used since the 1990s as a new approach to treating a number of incurable conditions, including inherited disorders, some cancers, and viral infections.
There have been some positive results, but in 1999 an 18-year-old US volunteer, Jesse Gelsinger, died after the treatment.
And some children given gene therapy for the immune disorder "bubble baby" syndrome have developed cancer.
 
Proof of principle
Prof Adrian Thrasher, of University College London, has carried out gene therapy on children with immune disorders.
He said the latest study was an encouraging proof of principle that gene therapy could have genuine therapeutic effects in other blood disorders.
"The good news is that technology is advancing rapidly, and it shouldn't be too long before diseases such as thalassaemia can be reliably and safely treated in this way," he said.
Dr Derek Persons, of St Jude Children's Research Hospital in Memphis, Tennessee, said the work was "a major step forward for the gene therapy of haemoglobin disorder".
He said further trials were planned at several centres in the US, including his own.
"This is very early days," he added. "The field will advance from people doing different trials."
In BBC News

Seda de aranha pode criar homens à prova de bala

A artista holandesa Jalila Essaïdi criou um material super-resistente a partir da mistura de seda de aranha com pele humana. O tecido ajuda à regeneração da pele e dos ossos e é capaz de parar uma bala, a metade da sua velocidade normal.
 

Seda de aranha pode criar homens à prova de bala
 
O trabalho original de Essaïdi é um vídeo que mostra o tecido a ser testado com um tiro. A artista, em conjunto com o biólogo celular Abdoelwaheb El Ghalbzouri, descobriu o possível sucessor do Kevlar, uma fibra sintética utilizada, por exemplo, nos coletes à prova de bala. A nova técnica pode, ainda, ser aplicada na medicina.
"A seda da aranha é três vezes mais forte do que o Kevlar. Para os coletes à prova de bala são necessárias 33 camadas de Kevlar. Se utilizarmos mais camadas de seda de aranha, pode ser mais eficaz parar uma bala", disse El Ghalbzouri, à Reuters.
O biólogo e a artista vêm, no entanto, mais potencial na mistura de pele e de seda quando se trata do desenvolvimento de enxertos de pele em pacientes com queimaduras.
"As células humanas parecem aderir bem à seda da aranha, mas são necessárias mais pesquisas", disse, ainda, El Ghalbzouri. "A seda de aranha pode ser um bom apoio para a regeneração óssea, bem como de cartilagens, tendões e ligamentos", acrescentou.
Graças à sua força e elasticidade o tecido pode, também, ser utilizado no fabrico de pára-quedas.
In Público



(des)Consciência

Um turbilhão de ideias e nada para escrever... Escreva, então, sobre o nada. Este nada que me atinge e me faz preocupar sem saber realmente de que se trata. Será ele um aviso, um presságio, um problema da complexa e incompreendida consciência?
Ai, consciência, quem serás? O que fazes, de onde vens? Na minha ignorância, lembrei-me de que, talvez por uns instantes, pudesse ser inconsciente. Não queria experienciar esta dimensão de forma total, apenas numa fração que me permitisse aperceber unicamente das matérias sensoriais. As que só nos fazem tilintar os sentidos, nada mais!
É tão difícil ser-se consciente. É tao difícil não o ser...
Olho o cão e apercebo-me disso quando coça freneticamente a orelha e não se importa - nem a mínima ideia faz - do que será que lhe causa aquela imensa comichão. Apenas se coça. Ela passa e ele, coitado, volta ao vazio onde é feliz.
E acreditem, dentro da sua pequenez de racionalidade (se é que a tem) ele é feliz. Consigo perceber que gosta que lhe toquem, que gosta de sair de casa e anunciar ao vento a sua natureza - é puro e desapercebido mas está lá.
Nunca o canídeo sofrerá de amor, de desgosto, dos inconvenientes de estar desperto. Contudo, surgiu-me a ideia de que nunca o atingirão também as coisas boas de possuir tal bênção.
Tentei pensar em algumas. Nada surgiu. Com certeza serei eu que não atingi tal nirvana. Com certeza...
Ser consciente ou não o ser? Para min não são opostos, são apenas dois diferentes caminhos de se viver isto a que chamamos de vida, de passar um tempo num corpo emprestado, de esperar o último Fado...
Taurino, Novembro de 2012
 
Gato que brincas na rua
Gato que brincas na rua
Como se fosse na cama,
Invejo a sorte que é tua
Porque nem sorte se chama.
Bom servo das leis fatais
Que regem pedras e gentes,
Que tens instintos gerais
E sentes só o que sentes.
És feliz porque és assim,
Todo o nada que és é teu.
Eu vejo-me e estou sem mim,
Conheço-me e não sou eu.

Fernando Pessoa