Comecei a escrever este pseudo-diário com base em alguns desabafos que
me iam passando pela cabeça numa tentativa algo estranha de desanuviar.
Em todos os textos que fui escrevendo nesse registo, fui apenas
desbravando caminhos turvos, caminhos tristes, confusos, que tentei de alguma
forma remediar ou alterar: para ser sincero nunca tive um rasgo de felicidade,
“escritamente” falando.
Há dias para tudo, reajustando a expressão.
Hoje é um dia para desabar a felicidade que tenho.
Sou um rapaz feliz, grosso modo. Tenho grandes amigos, uma grande
família e um país com um clima bastante agradável, diga-se.
Adoro rir. Mas assim a sério. Gosto também de fazer rir os outros, dar
um bocadinho não da minha felicidade que não vendo dessas coisas, mas da minha
simpatia, do meu bem-estar, porque coisas como felicidade não se dão nem se
emprestam e também não se compram.
O sorriso das pessoas, a correspondência da minha ingenuidade é, foi e
será sempre algo que me manterá “vivo”, porque quer queiramos quer não, a
felicidade dos outros faz parte da nossa felicidade.
Estou realmente feliz. Sorrio a escrever. Está uma bela noite.
Adoro música, tanto como as tartes da minha mãe. Tenho saudades dos
meus pais, mas sinto-os perto a cada telefonema, a cada piada seca, molhada,
morna, nem interessa. Sinto que as saudades se desfazem em palavras e no arroz
que me mandam de vez em quando. A distância, a saudade, o amor serão sempre
duros de roer, mas creio que a nossa dentadura é rija o suficiente para
aguentar.
Estou na rua, a saborear a brisa quase de verão a cada pedaço de vento
que me passa nas narinas. Adoro o verão.
Este ano foi, até agora, o mais incrível que já tive. Já sou homem e a
barba cresce cada vez mais rápido. A minha memória de nomes, caras, fórmulas,
números, letras, sons vai dilatando e começo a entender umas coisas de
Economia.
Não é por nada, mas estou mesmo bem cá fora, faz-me lembrar Sendim, o
meu jardim e os odores das plantas crescidas com montes de cores das quais só
metade sei o nome. Metade? Qual metade? Nem um quinto. De vez em quando ajudo a
minha mãe a regá-las. São bonitas mas a beleza dá trabalho, como ela costuma
dizer. De calções, chinelas e um mini escaldão no pescoço vou alimentando
aquelas cores e fico feliz por contribuir para a magia daquele local.
As estrelas estão bastante visíveis, sim, vê-se a Ursa Maior, aquela
sertã mal desenhada, mas tão brilhante que nos esquecemos que reluzem a muito longe,
tão longe que nem dá para entender muito bem.
Desde que estou em Lisboa, olhar
as estrelas lembra-me o Douro. O dourado que é refletido por aquela imensidão
de água é quase tão bonito como o loiro cabelo da minha irmã. Está uma mulher.
A quietude da Natureza, visível do meu quarto lá longe também me faz
falta. Mas saborear esses prazeres esporadicamente, torna-os mais incríveis,
mais apetecíveis.
Fazer desporto também me faz feliz. Perder uns quilitos, suar um bocado
e treinar o espírito de equipa: remédio santo para dormir bem. Com os exames à
porta, tenho tentado manter o ritmo para ver se durmo alguma coisa, mais que
não seja com as dores de pernas.
Tenho pena de não conseguir passar das duas páginas, preciso de mais
treino.
Para acabar, vou só dizer mais uma coisinha: riam-se e façam rir a
vossa família. Quanto a vocês não sei, mas a minha família é mais do que aquilo
que me está no sangue.
Thibaut Bandarra
Lisboa,
Algures em Junho
Nenhum comentário:
Postar um comentário